No dia 22 de novembro, mês da consciência negra, finalizamos o projeto Encanto Cultural no bairro Capela do Alto, no município de Guapiara, com uma exposição de fotografias. A experiência já seria "barbatimosa" apenas pelo fato de acontecer numa cidade, antes conhecida como capital do pêssego, localizada na região do Vale do Alto do Ribeira, próxima a algumas comunidades quilombolas e contornada por reserva de mata atlântica.
As fotos, feitas por crianças, adolescentes e jovens da comunidade do bairro e por mim, buscaram mostrar TUDO o que o bairro e a cidade oferecem de bonito e interessante culturalmente. Ora, TUDO, não é pretensão demais para uma fotógrafa educadora e seu grupo de alunos fotógrafos, quando se trata de uma cidade pequena, afastada e com poucos recursos. Mas TUDO, é sim, pretensão demais quando se descobre a cada dia que Capela do Alto e Guapiara têm muito a oferecer: natureza exuberante e riqueza de cultura. Mesmo assim continuamos, porque afinal esses alunos fotógrafos fazem parte do que há de melhor nesse TUDO: as pessoas do lugar.
Passeamos pela Capela do Alto como quem abre uma "caixa de guardados" de alguém especial e amoroso onde estão protegidos preciosidades e segredos delicados: fotos de pessoas queridas, cartas de amigos, bilhetes de amor, objetos de infância, lembranças de encontros, esperanças, sonhos.
Bom, não encontramos bilhetes nem cartas, mas pessoas com boa mão para a agricultura, que sabem o tempo certo de plantar e colher, que têm uma atitude "lavorenta" na vida e não temem chuva ou frio. E essa cidade é fria mesma! Que vivem da plantação familiar dominando um solo desgastado e inclinado, enfrentando a variação climática e o grande fazendeiro, que seca enormes extensões de terra com seus eucaliptos.
E fotografamos pessoas colhendo, cozinhando, dando aulas, costurando, fazendo artesanato, rezando, dançando. Crianças bincando, jovens em poses, homens e mulheres trabalhando... Depois pegamos um pouco disso tudo e fizemos uma projeção de 650 fotos no telão e mais 30 fotos emolduradas, que é TUDO o que uma exposição digna tem que ter.
Mas o melhor é que a exposição foi montada também pelos próprios alunos fotógrafos. Pois, por uma dessas peças que às vezes a vida nos prega eu e a assistente social responsável pelo andamento do trabalho não pudemos estar com os alunos na limpeza e organização da área expositiva: um enorme salão cedido pela igreja local. Mas segundo os alunos, nossa ausência foi decisiva para eles experimentarem o amadurecimento que o projeto propunha, pois ou eles esqueciam das diferenças entre si e se uniam para adiantar o trabalho ou valorizavam suas brigas pessoais e deixavam que no dia seguinte nós resolvessemos seus conflitos.
Tenho orgulho de dizer que meu alunos fotógrafos optaram por ser unir e trabalhar. Deram duro e removeram caixas, madeiras, móveis, bandeirinhas e decorações da festa anterior e deixaram o salão impecável.
No dia seguinte, eu e a assistente social Patrícia tivemos apenas que agradecer, montar o telão e organizar a colocação das fotos nas paredes, com a participação de todos é claro, inclusive daqueles que nem fizeram o curso. E bastava precisar de algo que esse algo surgiu: "hum, preciso de uma agulha" Lá estava a agulha que a mãe de alguma criança emprestou. "Hum, se tivéssemos mais uma trena mediríamos mais rápido". Logo o pai de outra já havia mandado uma trena para nós. "Outro martelo". Lá vinha o martelo. "Outra escada". Aparecia outra escada. E assim foi.
E assim fica fácil dizer que durante a exposição só tínhamos o que comemorar. Mas os aprendizados não pararam por aí. Como os fotógrafos habituais (meus alunos, Patrícia e eu) estávamos "em festa", convidamos o Ricardo Ferraresi, marido da secretária da assistência social Simone Duarte a fotografar. Com algumas dicas básicas de como utilizar a câmera e como fazer enquadramentos ele se animou e registrou nossos momentos de alegria. Em especial a entrega para cada aluno de um cd com todas as fotos feitas por eles.
Espero que essas palavras expliquem nossos sorrisos alegres e que sejam suficientes para expressar meu orgulho de ter realizado um trabalho com uma comunidade tão pronta para o crescimento coletivo. Pois creio que a maioria de nós que trabalha com educação sabe que o desenvolvimento de uma pessoa é nada quando contribui pouco em seu meio familiar e social.